Encontro Nacional dos Estudantes de Computação

Quebrar paradigmas - (Re) Construir o Movimento Estudantil

Esta contribuição inicialmente ao ENECOMP é aberta a contribuições e debates posteriores, não pretende ser algo fechado.

Vivemos em uma época de negação do movimento estudantil, como dos movimentos sociais em geral. Lógico que isso não é um movimento natural e espontâneo, existe uma lógica por trás disso, já que quando uma parcela da sociedade se abstém do debate político não quer dizer que não está fazendo política, sim está fazendo, mas para quem tem interesse nesse desprezo total pela política.

Fazer essa inferência é até óbvio, mas como sair disso? Esse é o problema central de nós que queremos pensar a política, não conseguimos vencer essas barreiras. Para vencê-las, temos que saber quais são elas ou o que as geram.

Definir isso é importante e difícil, mas uma questão que vem se clarificando nos últimos tempos é a questão da nossa organização, não conseguimos sair dos vícios e de práticas superadas pela história.

Dentre os vícios podemos destacar dois que são quase que opostos.

De um lado temos os militantes "revolucionários” [1], muito politizados, muito dedicados, mas que não sabem fugir dos muros de seu grupo de "revolucionários", não conseguem dialogar com o estudante que não tem a sua cultura política, que não tem a sua prática militante. Cria-se uma barreira que faz que com a veia política de muitos estudantes considerados despolitizados pelos "revolucionários" não seja despertada por falta de oportunidades, oportunidades de ter acesso a um debate mais básico e oportunidade de expressar suas idéias sem ser prontamente rechaçado ou ainda satirizado.

De outro lado estão os "homens e mulheres de boa vontade", é o maior grupo dentro do ME mas que não se organiza (seja onde for) e por isso se tornam manobrados pelos "revolucionários" quase sempre. Esse grupo se caracteriza por não conceber o movimento estudantil como movimento social e de transformação da realidade, fazem do ME uma espécie de ONG. Negam categoricamente a presença de partidos dentro do movimento, não se envolvem em questões políticas que não lhes atinge diretamente (ex.: Reforma Agrária, Luta por moradia....) e assim que terminam suas gestões ou cursos abandonam a política, ou quando muito vão para ONG´s ou repetirem as mesmas práticas em sindicatos.

Esses dois vícios do ME vem atrapalhando e muito o andamento do movimento como um todo, é um tema que deve ser estudado e aprofundado, já que é difícil escapar deles.

A partir desses vícios vamos aos problemas que eles acarretam que é onde queremos chegar com esse texto.

Existe uma estrutura que permanece na maior parte das instâncias do movimento, a disputa ao invés da colaboração. Entidades grandes como DCE´s e Executivas de cursos geralmente escolhem seus diretores por meio de eleições, onde chapas são confrontadas. Depois do processo, via de regra, os perdedores vão para a oposição, criando uma cisão dentro do movimento.

Essa característica de dirigir ao invés de construir é baseada em práticas superadas dos antigos partidos "comunistas" [2] e que não foi ainda desconstruída pelos atuais militantes dos movimentos sociais, por vários motivos que não fazem parte do escopo do texto [3].

Os grupos que defendem esse endeusamento da direção e a disputa fratricida pela mesma, acreditam que se a direção for revolucionária [4], logo o movimento o será. Ao que parece esquecem que o movimento é composto por pessoas, que muitas vezes estão muito afastados da ditas direções devido a práticas antidemocráticas, aparelhistas e etc.

Isso significa que temos que destruir as direções? Não, ainda não. Estamos em uma fase onde o fato de estar em uma diretoria motiva as pessoas, uma vez que a mesma se compromete com o grupo do qual faz parte (e mesmo assim, muitas vezes somem logo depois da posse). E no mais a não disputa não significa desorganização e não divisão de tarefas. Talvez um dia cheguemos a um patamar onde as pessoas conseguirão se organizar para tarefas comuns sem rótulos (diretor disso, ou daquilo), mas tudo tem o seu tempo. Para estimular isso, temos que destruir a burocracia e incentivar que os estudantes que não são diretores se sintam parte ativa da ENEC e desempenhem tarefas como se o fossem. Para isso o incentivo dos diretores é muito importante.

Dentro da ENEC temos uma organização diferente do padrão do movimento estudantil, não existem chapas, cada diretor é indicado por cada estado participante do ENECOMP. Ainda não estamos com a estrutura ideal, onde os diretores seriam indicados pelos encontros estaduais, mas essa forma tem garantido a pluralidade e a unidade de ação, coisas que faltam ao ME de forma geral.

Temos que dar um passo a mais na organização da nossa executiva e para isso urge fortalecer ou criar os encontros estaduais, criar políticas de expansão para Universidades/Estados que não conhecem/constroem a ENEC e começar a pensar política para fora da ENEC.

Pensar política para fora da ENEC é começar a entender o ME e, por extensão, a ENEC como um movimento social que não plana no ar, por isso tem que se posicionar e para tal deve começar a pensar isso coletivamente. Temos conseguido avançar e muito em temas como regulamentação da profissão e Software Livre, mas ainda nos faltam fóruns específicos para ampliar e dar mais bases a esses temas como cursos e/ou conferências entre os ENECOMP´s, que devem ser organizados pelos diretores para que esses temas não fiquem restritos aos participantes do ENECOMP e que dentro do mesmo o debate seja mais qualificado.

Esses possíveis cursos inicialmente poderão ser sobre os temas que já debatemos como software livre e regulamentação da profissão, e mais pra frente sobre outros temas mais gerais.

Como projeto piloto, podemos organizar o curso: Software Livre e Liberdade do Conhecimento, teoria e prática.

Finalizando, temos que unir forças para construir a ENEC no dia-a-dia, no nosso centro acadêmico e na nossa universidade. Quebrando o paradigma das disputas rumo a uma nova cultura política no movimento estudantil, onde a construção, a pluralidade e a unidade de ação sejam mais importantes do que disputas ideológicas, que são importantes, mas não podem frear as lutas que temos em comum.

[1] O termo REVOLUCIONÁRIOS está entre aspas porque esse grupo não é necessariamente revolucionário, mas se consideram como tal.

[2] Os partido que reivindicam ou reivindicaram o "socialismo real" do leste europeu, não podem jamais ser considerados comunistas, uma vez que ao invés do socialismo criaram um Estado Burocrática, autoritário, assassino e semi-feudal.

[3] Essa escolha não é somente política, existem questões de poder e dinheiro por trás desse tipo de construção.

[4] Revolucionária no sentido de transformadora.

-- MikeGabriel - 16 Jul 2006

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